Da limitação recursal no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho

Em 2014, em razão da redação dada pela Lei nº 13.015, a admissibilidade do Recurso de Revista tornou-se ainda mais complexa e elaborada, para não dizer intransponível.

 

Para entender melhor, citamos os três incisos que blindam a Corte do acesso ao recurso de revista:

 

Art. 896 – Cabe Recurso de Revista para Turma do Tribunal Superior do Trabalho das decisões proferidas em grau de recurso ordinário, em dissídio individual, pelos Tribunais Regionais do Trabalho, quando: (Redação dada pela Lei nº 9.756, de 17.12.1998)

 

(…)

 

  • 1o-A. Sob pena de não conhecimento, é ônus da parte: (Incluído pela Lei nº 13.015, de 2014)

 

I – indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista; (Incluído pela Lei nº 13.015, de 2014)

 

II – indicar, de forma explícita e fundamentada, contrariedade a dispositivo de lei, súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho que conflite com a decisão regional; (Incluído pela Lei nº 13.015, de 2014)

 

III – expor as razões do pedido de reforma, impugnando todos os fundamentos jurídicos da decisão recorrida, inclusive mediante demonstração analítica de cada dispositivo de lei, da Constituição Federal, de súmula ou orientação jurisprudencial cuja contrariedade aponte. (Incluído pela Lei nº 13.015, de 2014)

 

Como cada inciso merece uma atenção especial, vamos falar apenas do primeiro.

 

Pois bem, além dos critérios amplamente conhecidos: tempestividade, matéria de controvérsia de lei federal ou constitucional, eventual divergência jurisprudencial, com o devido prequestionamento da matéria no juízo a quo, trata-se de direito constitucionalmente assegurado ou infração a esse direito, entre outros; o recurso de revista agora necessita de cumprimentos específicos de formalidade – trazidos nos três incisos supramencionados – para que venha a ser, ao menos, conhecido.

 

Feito o breve registro, passemos detidamente ao estudo do inciso I, do 1º-A, do artigo 896 da CLT.

 

No Tribunal Superior do Trabalho instalou-se uma jurisprudência defensiva, que parece ser praticamente intransponível superá-la. Há um critério subjetivo atrelado ao excesso de formalismo, como podemos observar nesses julgados exemplificativos:

 

TST – AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA AIRR 3413720135030042 (TST)

Data de publicação: 07/08/2015

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOBSERVÂNCIA. FALTA DE INDICAÇÃO EXPLÍCITA E FUNDAMENTADA DO TRECHO DA DECISÃO RECORRIDA QUE COMPROVA O PREQUESTIONAMENTO DA CONTROVÉRSIA, DOS PRECEITOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS REPUTADOS VIOLADOS E DAS SÚMULAS E ORIENTAÇÕES JURISPRUDENCIAIS SUPOSTAMENTE CONTRARIADAS. REQUISITOS LEGAIS INSCRITOS NO ART. 896, § 1º-A, I, II E III, DA CLT. REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI Nº 13.015/2014. De acordo com o § 1º-A do art. 896 da CLT, com a redação que lhe foi conferida pela Lei nº 13.015/2014, sob pena de não conhecimento do recurso de revista, é ônus da parte: “I – indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista; II – indicar, de forma explícita e fundamentada, contrariedade a dispositivo de lei, súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho que conflite com a decisão regional; III – expor as razões do pedido de reforma, impugnando todos os fundamentos jurídicos da decisão recorrida, inclusive mediante demonstração analítica de cada dispositivo de lei, da Constituição Federal, de súmula ou orientação jurisprudencial cuja contrariedade aponte”. No caso dos autos, a Agravante não transcreveu no recurso de revista o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia (inciso I), de forma que as exigências processuais contidas no referido dispositivo não foram satisfeitas. Nesse contexto, o recurso de revista não merece ser processado, conforme fundamento da decisão agravada. Agravo de instrumento não provido.

 

TST – AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA AIRR 7444520135020038 (TST)

Data de publicação: 07/08/2015

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.015 /2014. 1. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DA PROVA PERICIAL. 2. JUSTA CAUSA. PRESSUPOSTOS RECURSAIS. INOBSERVÂNCIA. FALTA DE INDICAÇÃO EXPLÍCITA E FUNDAMENTADA DOS TRECHOS DA DECISÃO RECORRIDA QUE COMPROVAM O PREQUESTIONAMENTO DA CONTROVÉRSIA. REQUISITO LEGAL INSCRITO NOART. 896 , § 1º-A, I, DA CLT , COM A REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI 13.015 /2014. De acordo com o § 1º-A do artigo 896 da CLT , com a redação que lhe foi conferida pela Lei nº 13.015 /2014, sob pena de não conhecimento do recurso de revista, é ônus da parte: “I – indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista; II – indicar, de forma explícita e fundamentada, contrariedade a dispositivo de lei, súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho que conflite com a decisão regional; III – expor as razões do pedido de reforma, impugnando todos os fundamentos jurídicos da decisão recorrida, inclusive mediante demonstração analítica de cada dispositivo de lei, da Constituição Federal , de súmula ou orientação jurisprudencial cuja contrariedade aponte”. No caso dos autos, a parte não transcreveu, no recurso de revista, o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia (inciso I), de forma que as exigências processuais contidas no referido dispositivo não foram satisfeitas. Nesse contexto, o processamento do recurso de revista, quanto aos temas em epígrafe, encontra óbice no art. 896 , § 1º-A, I, da CLT . Agravo de instrumento não provido.

 

Poderíamos mencionar diversos julgados nessa linha defensiva, com a mesma posição jurídica, que a nosso ver permeia uma linha extremamente tênue de um possível cerceamento de defesa, deixando à margem o direito material em razão de ato ofensivo às garantias fundamentais entabuladas no acesso à Justiça, inscrito no inciso LV do Artigo 5º da Constituição Federal, por meio de interpretação restritiva da Corte Trabalhista a respeito dos requisitos de admissibilidade recursal do novo inciso I, § 1º-A, do artigo 896 da CLT.

 

Cabe-nos pensar que, ao contrário do que o Tribunal vem dispondo, a interpretação da lei deve ir muito além da leitura objetiva da terminologia trazida no dispositivo legal. Fazer isso é incorrer numa interpretação extremamente pobre.

 

Dizer que o inciso mencionado faz referência apenas a literal terminologia “indicação”, como se fosse sinônimo de transcrição de conteúdo da decisão recorrida ao bojo do pretenso recurso. Como já dissemos, essa visão limitada é, a nosso ver, incorrer na pobreza interpretativa da norma, que acabamos de mencionar.

 

Ao impor a incumbência à parte de indicar no seu recurso o trecho da decisão que pretende recorrer, pretende, a norma, delimitar a matéria de direito a ser impugnar sobre o recurso, ou seja, deve delimitar razoável, especifica e objetivamente a matéria pretendida, para evitar mera repetição de elementos trazidos em recursos outrora interpostos nos autos.

 

A intenção legislativa por traz da norma deve ser igualmente sopesada na interpretação, como sabemos.

 

Nem de perto a terminologia “indicar” poderia ser vista como uso sinônimo de transcrever, pois daí também poderia alguém pensar que o direito é menosprezado por ausência do “copiar e colar” da decisão recorrida.

 

E pior, que a eventual contextualização do recurso, cuja indicação do trecho da decisão que se pretende reformar está contextualizada em forma argumentativa no bojo do recurso, perde seu nobre valor por não ser ipsis litteris do trecho recursal.

 

Dessa linha de raciocínio há dois temores: o de notar o direito do jurisdicionado em ter o tão sonhado acesso à Justiça denegado, sem poder fazer uso de todas as ferramentas democráticas e garantidoras dos direitos fundamentais como a plena defesa e, pior, esbarrar em eventual interpretação literal e restritiva de norma processual/procedimental enquanto o direito material – que é, no fim das contas, o que interessa – jogado a vala.

 

Ademais, a poucos dias da vigência do Novo Código de Processo Civil, cuja base principiológica está na prioridade do julgamento de mérito das questões, evitando-se, portanto, a malfadada discussão de adequação procedimental, há de consignar, com tristeza, a necessidade de interposição de um recurso extraordinário para atacar decisão de cunho puramente limitativo de direito constitucional.

 

Com alteração recente da CLT, refletindo em especial no artigo 896, temos que concordar com a posição do Dr. Ricardo José Macêdo de Britto Pereira (Recurso de Natureza Extraordinária no TST, Editora JusPodivm, 2015):

 

Aspecto relevante ao acesso material à justiça é o direito do autor, bem como do réu e eventualmente de terceiros, de ter o caso resolvido. A abstração do direito de ação foi importante para assegurar o amplo acesso à justiça, mas sua aplicação rigorosa acabou levando a discussões intermináveis acerca de preliminares processuais. A formalização excessiva do processo impede o efetivo acesso à análise do mérito, do problema levado ao Judiciário, o que frustra as expectativas dos jurisdicionados. Não há dúvidas de que as formalidades são importantes, mas não como barreiras praticamente intransponíveis para se chegar à solução da controvérsia.

 

(…)

 

Ressalte-se que essa tendência concretista foi neutralizada com a teoria da asserção, segundo a qual as condições da ação são aferidas de acordo com as alegações das partes e não mediante análise profunda das condições que simplesmente propiciam o alcance de mérito. Caso contrário, só se asseguraria o direito de ação a quem fosse reconhecido o direito material.

 

(…)

 

O excesso processual, além de implicar denegação de justiça à parte, dificulta o prosseguimento do feito por meio de interposição do recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal e compromete a função do Tribunal do Superior do Trabalho de resguardar a aplicação do Direito do Trabalho e de uniformizar a sua interpretação.

 

Dessa forma, concluímos que, embora a norma seja – por si só – um obstáculo à parte superar, a fim de alcançar o tão sonhado acesso aos tribunais superiores com o fito de ver realmente o que interessa, que é o direito sobre o mérito da demanda, o Tribunal ainda sistematizou uma interpretação limitativa, pragmática e literal do inciso I, do §1º-A, do artigo 896 da CLT, impossibilitando categoricamente o acesso à justiça e cerceando o direito de defesa da parte.

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