Há alguns anos se fala da tal terceirização das atividades meio[1], tanto daquela que se dá no ente público como também no meio privado.
Embora exista um Projeto de Lei, de número 4330/04[2], nossa intenção aqui não é discutir o projeto[3], mas as dificuldades de lidar com a terceirização, sob o ponto de vista dos gestores dos serviços: as organizações sociais e OSCIP.
Por tratar-se originalmente de finalidade pública, que obviamente necessita do uso do dinheiro público para gerir, direta ou indiretamente, o serviço, quando o assunto terceirização é debatido, consecutivamente cai por um viés político.
Ainda mais em quadro de sucessivos escândalos, decorrentes da “Lava-Jato”, falar em terceirização no Brasil virou sinônimo de corrupção. Infelizmente essa perspectiva vem do comportamento de maus políticos e gestores criminosos, porque, a essência da terceirização dos serviços públicos só tem proveito positivo.
Ao Estado, ao longo da sua existência, não foi pensada e muito menos trabalhada a expertise sobre o desenvolvimento de tecnologias e especificidades. Enquanto às empresas, obviamente intencionadas no lucro, investiram tempo e recursos no aprimoramento de determinados produtos e serviços. O foco, aliás, é um dos fatores determinantes que faz de uma empresa referência na prestação de serviços ou no fornecimento de um certo produto. Agora, faz sentido o Estado, que não tem essa finalidade existencial, investir tempo e recurso em todos os seguimentos? Primeiramente há uma inviabilidade operacional. E, como argumento derradeiro, esse não é o propósito do Estado, ser uma grande e infindável estrutura acolhedora de serviços[4].
Tudo que falamos até aqui está no plano ideológico. Na prática há de se considerar, como mencionamos no começo, as más intenções dos gestores públicos, terceirizando serviços aos seus colegas políticos, com o proveito ilícito. E nessa situação é claro que a expertise é deixada de lado, pois o foco é outro. Mas, quando há a legítima terceirização, com o fito social, só pode haver a melhora do serviço. Dessa inspiração que empresas internacionais participam de concessões de serviço público[5]. A nível municipal muitas vezes as associações locais, que já desenvolvem um trabalho específico de sucesso, na área social, da educação e da saúde, alcançam o status de Organizações Sociais (OS) e OSCIP’s, por meio de parcerias com o Poder Público.
Excetuando-se os pontos nebulosos da corrupção, que devem sempre ser atentamente observados pelo Ministério Público e o Tribunal de Contas, e partindo do princípio da boa-fé na gestão dos serviços sociais, consideramos a terceirização dos serviços públicos um avanço, pois há quadros, principalmente ligados à área da saúde, que a burocratização pública impede a eficácia do serviço. Imagine, por exemplo, uma situação emergencial, que demande a expertise sobre o tema, enquanto ao gestor especializado a toma de decisão será facilmente acessível e tomada, ao gestor público, desconhecedor da solução e desprovido dos instrumentos, precisará recrutar a solução externa, que demandará tempo, ainda que emergencialmente o tramite seja mais célere, por si só a busca da solução já demandará tempo.
Situação estranha acontece nos meandros da prestação de serviço da OS e da OSCIP, pois muitas vezes o serviço é prestado com zelo e excelência e, mesmo assim, o Ente Público atrasa os repasses sob a alegação de simples falta de verba. Vamos pensar, isso é justo motivo? É claro que não! Quando uma empresa atrasa salários, sofre represálias fortes dos órgãos de fiscalização. Agora, qual a consequência imediata e efetiva em relação ao gestor público que não repassa a verba decorrente do contrato de parceria? Num primeiro momento, nenhuma! A longo prazo talvez a responsabilização pela má gestão do dinheiro público. Enquanto isso a associação quebrará e os seus trabalhadores sofrerão com a consequência. E a culpa são das OS’s e OSCIP’s?
A terceirização de serviço não pode ser usada como mecanismo de manutenção dos serviços públicos sem recurso. Em outras palavras: o gestor público, sem dinheiro em caixa e ciente de que a curto ou médio prazo ficará sem giro financeiro não pode usar da ferramenta da terceirização para manter ativos os serviços públicos, porque, sem pagar a associação, essa manterá os serviços, pelas imprescindibilidades deles e com a esperanças de receber o passivo.
Esse contexto acontece em muitos municípios. Acontece até a nível estadual. O poder da caneta conferido aos Prefeitos e Governadores é enorme, enquanto a responsabilização deles, embora exista, e a “Lava-Jato está aí para provar isso, é muito tardia. Até lá pessoas pagaram a conta e as associações e as empresas que já prestaram serviços quebraram, pois, o valor será pago por meio de precatório.
[1] Atividade meio, como o nome já diz, tem por objetivo contribuir, auxiliar, desenvolver o negócio com o objetivo de atingir a atividade fim. Por exemplo, uma indústria que terceiriza os serviços de portaria e limpeza, típicas atividades meio, quando, no exemplo citado, a atividade fim é a fabricação dos produtos.
[2] Notícia do site: http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/trabalho-e-previdencia/486413-camara-aprova-projeto-que-permite-terceirizacao-da-atividade-fim-de-empresa.html, acessado hoje, dia 17.03.2017, as 09h01min.
[3] Já o fizemos, em 2015: https://jus.com.br/noticias/38025/comentarios-ao-projeto-de-lei-4330-04-terceirizacao-de-mao-de-obra, acessado hoje, dia 17.03.2017, as 09h01min.
[4] É bem verdade que uns pensam assim e por isso hoje há os déficits orçamentários, cuja folha de pagamento em alguns municípios representa 70 a 80 por cento do gasto do dinheiro público.
[5] Notícia do site: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/03/1867272-leilao-de-aeroportos-e-marcado-por-ausencia-de-empreiteiras-investigadas.shtml, acessado em 17.03.2017, as 09h11min.